Olhos Castanhos

Por detrás destes olhos castanhos está toda a frustração de quem não consegue apenas esquecer; toda a dor acumulada; o sofrimento que não pode ser visto. Por detrás destes olhos castanhos estão todas as embranças de tempos que já não voltam; os risos que agora rareiam; os momentos de cumplicidade que tão rápido ficaram perdidos em um passado não muito distante.

Por detrás deste meio sorriso que brinca em meus lábios quando a nostalgia domina a parte racional do meu ser estão todas as coisas bonitas que já pensei em te dizer; todas as confidencias que nunca te fiz; todas as risadas que morreram antes mesmo de existir.

Neste meio sorriso triste que transparece em meu semblante estão todas as esperanças infundadas de alguém que já sangrou o bastante para saber o que é razão e ilusão.

Nos meus punhos cerrados junto ao meu corpo está a agonia de saber-te com alguém que não necessita de ti como eu.

Nestas palmas onde minhas unhas enterram-se a ponto de verter sangue está toda a vontade de fazer-te um carinho, e a raiva de por saber que tal ato já não me cabe.

E quando me abraço tenho uma vontade de te abraçar que julgo insana. Uma necessidade de estar com meus braços ao redor de ti e proteger-te de tudo.

E nesse mesmo abraço com o qual me rodeio está toda a cautela que uso para me proteger. Está eu mesma comigo nas horas que mais necessito de ti.

Nessas músicas que escuto estão todos os meus pensamentos mais secretos acerca de ti. Está toda a vontade infantil de que sofras como sofro ao te ver todos os dias e ter que conter meus atos...

E também o mais sincero desejo de que encontres alguém de quem gostes da maneira que gosto de ti e possa ser correspondido.

Na solidão do meu quarto há a vontade de lutar pelo que quero batendo de frente com a certeza de que tu és algo que eu nunca realmente tive.

Por detrás das atitudes tão bem pensadas (ou não), cínicas e agressivas, estão todo o medo de demonstrar o quão frágil me sinto por dentro, esgotada mentalmente pela luta interminável do meu dilema infrutífero.

Na minha mente está a comparação do que eras quando estavas comigo com quem és agora; agora que tu és esta pessoa que tão penosamente chamo apenas “amigo”... A doce ilusão de que rias mais quando estavas ao meu lado.

Nas lembranças está o conforto que entristece; a saudade dos teus braços me cercando, de poder encostar a cabeça em teu ombro, sentir o teu cheiro e crer que tudo está bem.

Meu reflexo no espelho apenas me mostra o nível de desespero quando olho meus olhos castanhos... Como se eu precisasse de algum lembrete!

Na escuridão que contemplo ao cerrar as pálpebras estão todas as lágrimas que ainda não consegui chorar, retidas pela promessa de que aquelas seriam as primeiras e únicas que verteriam por tua causa.

E por detrás destes olhos castanhos fica subtendido tudo aquilo que anseio por te contar e que você nunca vai saber.

Quando olhar para eles pode até perceber que algo aqui – dentro de mim – não está bem, pois estes olhos castanhos têm as sombras que prenunciam a tempestade; entretanto não conseguirás – de fato – decifrar.

E, se por acaso acontecer de me perguntares o que há, colocarei em minha face um meio-sorriso e murmurarei que “está tudo bem”, pois até tua amizade é importante demais para que eu abra mão, mesmo que isso cause mais uma cicatriz em meu interior.

Ao virares as costas, e baixarei minha face de modo que meus cabelos criem uma sombra sobre meus olhos castanhos onde já ocorre a tempestade. Deixarei que meus punhos caiam cerrados ladeando meu corpo.

Meu meio sorriso já não vai mais existir; os cantos dos meus lábios estarão tremendo, mesmo que nenhuma lágrima caia.

Tão logo eu consiga, sairei de perto de ti. Caminharei com meus fones ao máximo, impedindo-me de pensar, enquanto miro fixamente a lua.

Ao voltar a te ver, você cai olhar para mim e sorrir, e então eu terei mais uma vez a certeza de que não me importa quantas declarações eu receba, quantos me queiram, pois a eles eu não quero.

Deitada em minha cama horas depois contemplarei a escuridão e amaldiçoarei o destino por ter me dado a chance de saber como era estar ao teu lado para depois me tirar de lá e, detalhe por detalhe, reviverei cada lembrança nossa.

Mesmo após a Dama do Sono guiar-me até o País dos Sonhos, tu estarás lá, na minha ilusão perfeita ou no pesadelo tenebroso. E, ao acordar, me sentirei traída e ferida, pois, mais uma vez, estive contigo sem te ter.

Mais uma vez eu me encararei no espelho, mirando estes olhos castanhos tão cansados de sofrer; jogarei água fria em minha face e murmurarei para meu reflexo que “isso tudo um dia passará”.

E, ao voltar para minha cama, tentarei lutar contra a parte de mim que espera o dia em que possas corresponder meu sentimento e eu veja o que desejo no fundo dos teus olhos castanhos...